17 outubro 2009

Alquimia da Alma




"Anda vá, digere-te a ti mesma se fores capaz!" disse a voz.

"Sabes bem o que custa, por isso desafio-te. A vontade humana é limitada e os labirintos em que se perde, gigantescos. Por isso, vá, mostra-me do que és capaz e digere-te, na íntegra, como se de um repasto fabuloso se tratasse!"


A Alma teve vontade de rir, não fora a gravidade da situação. Tentou mexer-se e sentiu o peso das correntes que a agrilhoavam. Eram poderosas e enferrujadas. Podia encolher-se a um canto e esperar que fosse apenas um pesadelo ou tentar sair daquela aresta afiada, por si criada, da existência.

Avaliou e concluiu.

Era necessário passar de nível. Se se tinha autoproposto, agora tinha de conseguir.


Com os dentes afiados por anteriores batalhas rasgou o pulso e sorveu o próprio sangue. Sorveu, sorveu e sorveu com gula e volúpia. Sempre gostara do sabor do seu sangue, não era sacrifício nenhum.

Com um caco, de certeza deixado ali para o efeito, começou a rasgar a barriga até poder meter a mão na teia das entranhas. Não havia dor uma vez que se encontrava no mundo mental e tudo eram projecções. Retirou um emaranhado desconhecido e sangrento de peças orgânicas, moles e quentes. Agora sim, começava a provação.

Fechou os olhos.

Meteu-as à boca.

A digestão começava.

Seria isto a Alquimia da Alma?